quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Os pragmatistas são relativistas ou etnocêntricos?

Os pragmatistas são relativistas ou etnocêntricos?
                   Os pragmatistas são vistos pelos realistas como “relativistas” sob três visões diferentes: a primeira visão é a de que toda e qualquer crença é tão boa quanto qualquer outra, segunda, a de que a “verdade” é um termo equivoco possuindo tantos significados quanto houver procedimentos de justificação e, finalmente a terceira , a de que não há nada a ser dito nem sobre a verdade nem sobre a racionalidade para além das descrições dos procedimentos familiares de justificação de uma dada sociedade- a nossa- emprega em uma ou outra área de justificação.
           Os pragmatistas tomam o terceiro ponto de vista etnocêntrico para uma justificação baseada na solidariedade. Entretanto, os pragmáticos não têm uma teoria da verdade nem uma teoria relativista, enquanto partidários da solidariedade sua avaliação do valor da investigação humana cooperativa só possuem uma base ética não uma base epistemológica ou metafísica- ele snão possuem nenhuma epistemologia relativista

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

LEITURA COMPLEMENTAR: "O que é pragmatismo?" Por Paulo Ghiraldelli Jr.

1. O esquilo e o pragmatismo

“Viram o Jorge? Diante de tantas opiniões e choros, ele pegou o caminho mais objetivo, desconsiderou questiúnculas e foi direto ao ponto. Resultado: deu a solução rápida. Jorge é um cara pragmático”.

O parágrafo acima mostra o que a maioria das pessoas imagina que é “um cara pragmático”: alguém que desconsidera firulas e consegue realizar os objetivos que lhe foram postos. No caso aí, Jorge é pragmático e, ao mesmo tempo, bem avaliado – elogiado até. Todavia, na maioria das vezes, quando alguém é chamado de pragmático, está se falando de uma pessoa exatamente como o Jorge, mas avaliado como de caráter duvidoso por ter “desconsiderado questiúnculas” e visado acima de tudo seus objetivos. No geral, no linguajar popular (especialmente no Brasil), pragmático é alguém que age segundo uma visão exageradamente fixa apenas nos resultados e, assim fazendo, não se importa com os “inevitáveis efeitos colaterais”. Assim, a noção comum de pragmático é a de uma pessoa que, no melhor, evita o dispensável para resolver uma situação e, no pior, faz o que tem de fazer sem considerar reflexões e ponderações sobre o prejuízo de outros envolvidos no caso, direta ou indiretamente.

Não creio que o pragmático deva ser visto assim, negativamente. Vejo isso como um erro. O erro cresce ainda mais quando se confunde essa idéia de “pragmático” como sendo o adepto da filosofia pragmatista. O filósofo pragmatista não é este pragmático aí acima, tomado pela conversa corriqueira. Então, o que é o pragmatista?

Eis um exemplo. O filósofo pragmatista chega a um lugar em que dois grupos de filósofos estão engalfinhados em uma terrível discussão sobre um esquilo. Há um esquilo subindo em torno de uma árvore e um homem tenta segui-lo. Mas o esquilo se move rapidamente de modo que ele sempre consegue manter a árvore entre ele e o homem, uma vez que quando o homem roda em torno da árvore o esquilo também anda. Os filósofos estão divididos, eles querem decidir sobre a seguinte questão: o homem gira ou não em torno do esquilo?

O exemplo é de William James (1842-1910), um dos filósofos americanos fundadores do pragmatismo. Ele se coloca no exemplo como sendo o filósofo pragmatista. Entra no problema munido de um adágio da filosofia medieval: “quando há uma aparente contradição, faça uma distinção”. Então, usa disso para resolver o problema, a partir da técnica de distinguir perspectivas. James pergunta o que os filósofos querem dizer com a expressão “girar em torno” e, para visualizar as possibilidades, traça duas descrições do caso. Primeira: quando se toma o homem ocupando o norte, o sul, o leste e o oeste em relação ao esquilo, então se pode dizer que é correto falar que “ele gira em torno do esquilo”. Mas se o que está valendo é dizer que o homem, inicialmente, se coloca na frente do esquilo, depois à direita dele, atrás, à esquerda e finalmente na frente dele novamente, então não é verdadeiro dizer que ele “gira em torno do esquilo” (fig 1).

Fig. 1
O filósofo pragmatista (no caso, James) não se desviou da questão, indo para um debate metafísico sobre “a natureza da verdade”. Também não aceitou a idéia de diferenciar radicalmente o termo “correto” do termo “verdadeiro”. Muito menos ficou atarantado sem fazer distinções. O filósofo pragmatista entrou na experiência vivida ali naquele momento e fez as distinções sobre uma descrição possível e sobre um redescrição possível. Resolveu o enigma de modo pragmatista. Em certo sentido, por dar um tipo de solução ao debate, apontando para o encerramento da polêmica, agiu de um modo que não seria errado dizer que foi também pragmático.

No texto de 1907, “O que significa o pragmatismo”, em que dá este exemplo do esquilo, James lembra que o filósofo pragmatista, no caso ele próprio, não foi festejado pelos filósofos presentes na polêmica, por resolver a questão como resolveu. Os filósofos tradicionais continuaram o debate e o acusaram de não ter resolvido coisa alguma, apenas ter se desviado do problema. Por que falaram isso? Ora, porque James não tinha, de fato, dado a natureza do ato de “girar em torno” ou o significado de “girar em torno”.

James não colocou no seu texto de 1907 esse alerta à toa. Ao falar da avaliação dos filósofos tradicionais a respeito de sua intervenção na polêmica sobre o esquilo, James quis lembrar o quanto aquela doutrina que ele e outros estavam criando não seria aceita, nunca, como uma doutrina autenticamente filosófica pelos filósofos metafísicos e tradicionais. Afinal, quem mais tem preconceito é quem lida com conceitos, e se os filósofos tradicionais se dizem criadores de conceitos, nunca foi difícil, para eles, se afundarem em preconceitos.

2. Uma doutrina maldita

Talvez nenhuma outra doutrina seja realmente tão maldita na história da filosofia quanto o pragmatismo. Fala-se em Hobbes e Sade como filósofos malditos. Mas que nada! Eles nunca tiveram a unanimidade das opiniões contra eles. Mas o pragmatismo sim. O pragmatismo se tornou uma filosofia realmente incômoda – e proibida em alguns lugares. Émile Durkheim (1858-1917) chegou a dizer que banir o pragmatismo da França era uma questão de “soberania nacional”, pois aquela filosofia americana seria amiga do perspectivismo de Nietzsche e, portanto, uma “doutrina irracionalista”. A França, protetora da tradição racionalista, disse Durkheim, nunca deveria deixar tal filosofia pisar em seu solo.

Logo depois, nos anos trinta no Brasil, quem reagiu contra os pragmatistas em nossa terra foram os religiosos – especialmente os pensadores católicos. Eles viram no pragmatismo não mais só um amigo de Nietzsche, mas também de Marx – os pragmatistas eram tão materialistas quanto os comunistas e, como “negadores de Deus”, deveriam ser postos para correr. Muitos anos depois, na década de noventa aqui no Brasil, professores não tão importantes e rigorosos quanto Durkheim e bem menos capazes intelectualmente do que os religiosos anti-pragmatistas dos anos trinta, falaram contra o pragmatismo. O tom era o de desdém para com a filosofia americana, mas as ligações que a tornavam pecaminosa eram, agora, distintas das do passado: o pragmatismo não podia vingar no Brasil uma vez que era, para esses novos caçadores de bruxas, uma “doutrina aliada ao imperialismo americano”. Talvez os que assim falaram quisessem, também, tirar daqui o pragmatismo por razões de “segurança nacional”. Só não usaram essa expressão – “segurança nacional” – porque, sendo professores de filosofia, acharam por bem não colocar na própria boca uma fórmula tão desgastada pela nossa Ditadura Militar (1964-85).

O que professores de filosofia brasileiros jamais souberam, quando do descabelamento diante do pragmatismo, é que muito do que foi feito em nosso país, em termos de cultura e educação, só foi levado a cabo porque seus idealizadores eram pragmatistas. Uma tradição pouco paulista e muito mais carioca e nordestina de discussão cultural, embebida em pragmatismo, vingou no Brasil a partir dos anos vinte, algo que durou de forma bastante produtiva até os anos sessenta. Anísio Teixeira (1900-1971) foi o grande expoente do pragmatismo americano no Brasil. Esse pragmatismo se revelou como doutrina pioneira no campo da filosofia da educação. Paulo Freire (1921-1997) foi um seguidor de Anísio e, por intermédio deste, de John Dewey (1859-1952), outro grande filósofo americano, também na linha dos fundadores do pragmatismo.

3. Um filósofo “do contra”

Atualmente há um bom número de filósofos pragmatistas, em diversos países. Todavia, a maior parte dos historiadores da filosofia concorda que o americano Richard Rorty (1931-2007) foi o maior expoente dessa família no último quarto do século XX. No âmbito técnico da filosofia acadêmica, Rorty ficou conhecido pelo seu trânsito fácil entre a “filosofia continental” e a “filosofia analítica”, criando uma discussão bastante interessante sobre a verdade, resumida de modo emblemático em sua frase “se cuidamos da liberdade, a verdade cuida de si mesma”. Mais popularmente, como filósofo que recuperou para a América a tradição da qual Dewey foi o maior representante, a do intelectual que se coloca na mídia para inserir-se nos grandes debates de sua época, Rorty ficou conhecido por ser “do contra”, alguém sempre disposto a desconfiar da esquerda marxista-nietzschiana-foucaultiana e de discordar francamente da direita, tanto a regida por Reagan quanto a de Bush filho. Acusou ambas, esquerda e direita, de nunca terem se afastado de um essencialismo de tipo religioso.

Rorty viu a maioria dos professores de filosofia como “padrecos”. Ou seja, tanto à direita quanto à esquerda, os professores de filosofia nunca quiseram outra coisa senão admoestar os colegas do mesmo modo que os filósofos tradicionais fizeram com William James. Viram a filosofia como uma empresa que, de uma vez por todas, dá o significado de “girar em torno”, sem deslizar para a distinção de perspectivas do uso que se pode fazer do “girar em torno” nos contextos lingüísticos. Uma parte desses professores advoga que no céu platônico há uma forma perfeita que fornece, de uma vez para sempre, o que é o “girar”. Outra parte deles acredita que, por meio de alguma “análise da linguagem”, o significado final de “girar” pode ser determinado. Esses dois grupos nunca engoliram James por ele ter deixado de lado tais questões e se concentrado apenas em dar uma resposta pragmática para a questão posta diante do lépido esquilo. Isso que foi, no passado, uma objeção a James, foi transferida contra Rorty em forma de ódio. Talvez porque Rorty tenha dito que a filosofia deveria esquecer a conduta do padre e adotar a conduta do engenheiro e do advogado.

O padre tem uma regra única para todo e qualquer problema. Ele mostra os Mandamentos e a fé. Você pode estar com dor no dedão do pé ou com falta de dinheiro ou ter brigado com sua mãe ou esposa e, então, você procura um padre. O que ele faz? Ele lhe dá os Mandamentos e os segredos da fé e resume tudo numa frase: “creia na palavra do Senhor”. O filósofo herdeiro do platonismo ou do positivista lógico age de modo semelhante: pensa que dá solução universal, única e final para quem o procura sobre o caso do esquilo. Ele imagina poder resolver de vez, com uma descrição, o que se quer dizer ao se falar “girar”. Ora, o filósofo rortiano age pragmaticamente como o advogado ou o engenheiro que recebe seu cliente. Não há uma planta única para oferecer ao cliente que quer uma casa. Não há uma defesa única para o cliente que vai enfrentar o tribunal. Cada caso é um caso, e junto com o cliente, pragmaticamente, o advogado monta uma estratégia de defesa e o engenheiro, de modo semelhante, desenha o esboço da casa desejada. Conversar e distinguir perspectivas e ver o que está em jogo – eis aí a atitude de James. Eis aí, também, o que Rorty recolocou na agenda da filosofia. Mas que irritante, não?

Irritante? Claro que sim, pois os filósofos, como muitas pessoas, acham que essa condição nossa, humana, de não ter a chave única, geral, para todo e qualquer problema, é uma incompetência, um defeito da ciência com o qual a filosofia não conviveria. Eles voltam ao platonismo e ao positivismo e cobram, em desespero: queremos a resposta. Eles não entendem de construção de casas e de defesas, eles apenas sabem viver de religião dogmática, de resultado único: “creia na palavra do Senhor e, assim, vá até ali no seu cantinho do altar e reze treze Ave Marias”.

No limite, o que Rorty disse é um pouco o que Nietzsche havia dito: filósofos tradicionais são substitutos de sacerdotes. Ficam se purificando e acreditam que vão, assim, com as Formas ou com a Análise da Linguagem, dar sempre a mesma solução tanto para o terrorismo de Bin Laden quanto para a escolha do sutiã para o próximo desfile de Gisele Bündchen. Quando Rorty diz que talvez eles não tenham esse poder todo, eles se irritam. Irritam-se não só porque perdem poder aos olhos de seus alunos e, às vezes, de um público mais amplo, mas também porque não conseguem enxergar outra utilidade para a profissão de professor de filosofia e, assim, olham para Rorty como um “quinta coluna” que quer destruir seus empregos. É como se Rorty tivesse nascido apenas para tirar o leite da boca de seus rebentos.

Rorty nunca achou que a filosofia precisaria, para ser filosofia, ter de apresentar uma chave única de leitura de qualquer texto. Ele sempre acreditou na filosofia como quem mostra que os manuais estão corretos quando dizem que a verdade, sendo propriedade de enunciados, é sempre objetiva. Mas, ao mesmo tempo, Rorty nunca achou que dizer isso ajudaria em alguma coisa, uma vez que, logo que dizemos que “é verdade (objetivamente) que o homem gira em torno do esquilo”, temos de, em seguida, vir com razões – que implicam em uma perspectiva e, nesse sentido, um grau de subjetivismo – para justificar porque dissemos o que dissemos do homem e do esquilo.

A filosofia se propõe a fazer o homem não esquecer que ele está em um “jogo de dar e pedir razões”, como escreveu outro pragmatista americano contemporâneo, Robert Brandom. Estar desprovido de consensos eternamente definidos não significa que não podemos nos entender. Estamos nos entendendo faz muito tempo, pois nunca conversamos a partir de uma perspectiva subjetivista, e sim intersubjetiva. Caso contrário a própria noção de linguagem, que nada é senão comunicação, não seria possível. Essa conclusão tipicamente pragmatista não é estranha a outras doutrinas contemporâneas em filosofia. Do outro lado da América, entre os anos oitenta e noventa, um autor menos perspectivista, achou razoável iniciar um diálogo com Rorty. Esse filósofo, o alemão Jürgen Habermas, atravessou o muro da Escola de Frankfurt e se aproximou consideravelmente da filosofia americana, sob uma nova ótica. Estava feita a ponte com a qual o pragmatismo abriu o século XXI, e por onde, em minha opinião, pode distribuir bons frutos para a filosofia em um futuro próximo.

Texto disponível em: http://ghiraldelli.blogspot.com/2010/02/o-que-e-o-pragmatismo.html

Os pragmatistas são relativistas ou etnocêntricos?

Os pragmatistas são vistos pelos realistas como “relativistas” sob três visões diferentes: a primeira visão é a de que toda e qualquer crença é tão boa quanto qualquer outra, segunda, a de que a “verdade” é um termo equivoco possuindo tantos significados quanto houver procedimentos de justificação e, finalmente a terceira , a de que não há nada a ser dito nem sobre a verdade nem sobre a racionalidade para além das descrições dos procedimentos familiares de justificação de uma dada sociedade- a nossa- emprega em uma ou outra área de justificação.

Os pragmatistas tomam o terceiro ponto de vista etnocêntrico para uma justificação baseada na solidariedade. Entretanto, os pragmáticos não têm uma teoria da verdade nem uma teoria relativista, enquanto partidários da solidariedade sua avaliação do valor da investigação humana cooperativa só possuem uma base ética não uma base epistemológica ou metafísica- ele snão possuem nenhuma epistemologia relativista